31.10.03


Insônia - Parte Nove
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Ainda demorei uns minutos, pensando, pra entender o que aquilo realmente significava. Enquanto o vapor do café subia e enchia minhas narinas, Fred foi até a janela, onde observava a madrugada transcorrer no centro de São Paulo, enquanto a chuva começava a diminuir.

"Como eles conseguiram? Como fazem isso?", sussurrei.

Fred provavelmente não me ouvira, mas Simone sentou-se mais na beirada da poltrona onde estava, para continuar a me contar sobre toda a bizarrice em que minha vida tinha se transformado. "O que viemos descobrir tempos depois é que os Dreamies estavam morrendo. Nunca soubemos exatamente o que está acontecendo com eles, mas o fato é que eles precisam de corpos para continuarem perpetuando".

"E eles simplesmente tomam os corpos das pessoas? O que evitou que eles dominassem todos os humanos, afinal?"

"Não é tão simples assim. Felizmente. Existem certas condições, a invasão só é possível quando o cérebro humano produz algumas substâncias, características de quando temos bons sonhos. Quando sentimos prazer ao dormir e sonhar".

"Mesmo assim, Simone. Todo mundo dorme e sonha TODAS as noites", eu começava a ficar claustrofóbico em meus próprios pensamentos, imaginando se esses monstros estiveram me espreitando durante meus sonhos. O que os teria impedido de me dominar? Será que eu já estava sob o comando deles e nem mesmo disso sabia? Não! Loucura demais! Mais uma camada de pensamentos e medos suprimidos assentava-se sobre mim.

"Ele chegou", disse Fred, afastando-se da janela. "Temos de nos apressar".

"Ele? Quem é 'ele'?", eu começava a me sentir eufórico de novo. Sentia que estava perdendo o controle. "Fred, responde! Eu estou ficando tonto. Nervoso. Eu quero ir embora! Quero acordar de vez!!". Eu já não tinha mais condições de me manter calmo.

E então Fred apontou na direção do próprio pescoço, como se indicasse que eu fizesse o mesmo. Com o pouco de controle que me restava, levantei minha mão esquerda e tateei meu pescoço com doi dedos. Fred apenas assentiu com a cabeça, quando eu finalmente encontrei algo sob minha pele. Um caroço, era o que parecia, mas quando o toquei por inteiro, percebi o que era: um botão, muito sensível ao toque. E ao pressioná-lo, tive aquela mesma sensação horrível de ter minha cabeça deslocada para longe do meu corpo. Contudo, a seguir senti um alívio, e como se nunca tivesse estado lá, meu desespero iminente e minha tontura desapareceram. Recostei-me no sofá. "O que é isso? O que aconteceu comigo?"

Fred caminhou em direção à porta da sala. "Isso é um estabilizador, Alexandre. Ele impede que você perca o controle, e impede que você desperte nos sonhos de outra pessoa. Lembre-se disso sempre. O estabilizador é muito útil, principalmente considerando que você não vai dormir mais."

Ele sabia o que estava dizendo. Disso eu tinha certeza. E não fosse a recente aplicação do estabilizador, eu teria pirado mais uma vez. "Não vou dormir mais?"

Simone levantou-se. "Por que você acha que temos essas lindas olheiras? Entrar no projeto significa que você nunca mais vai conseguir dormir. Não conseguimos explicar totalmente o que acontece, mas enfim entramos todos numa eterna insônia. Entretanto, digamos que você ainda pudesse dormir, Alê. Você se arriscaria?"

Eu apenas balancei a cabeça, negativamente, enquanto dirigia meu olhar para chão. "E como vocês não enlouquecem?"

"Quem disse que não?", respondeu Fred, antes de rir alto novamente e sair pela porta.

"Simone, eu.."

"Eu sei. Você está muito confuso. Eu entendo. Mas você vai entender tudo. Agora precisamos ir. Emerson vai nos levar até um prédio perto daqui, onde poderemos te mostrar o que o projeto realmente faz para evitar que os humanos sejam dominados".

"Quem é Emerson?".

"O líder do projeto em São Paulo".

See Ya