25.10.04

Alternativa E: todas as anteriores


Li no dia sete uma coluna do Contardo Calligaris (ele de novo) na Folha de S.Paulo cujo título é "A cura da homossexualidade". Basicamente, o texto fala sobre um projeto de lei que será votado na Assembléia Legislativa do estado do Rio de Janeiro e que autoriza o uso de dinheiro público para financiar quem se dispuser a "converter" homossexuais em heterossexuais.

Mais um ingrediente nessa receita: na semana que vem tem eleições para presidente nos Estados Unidos. Indiretas, a rigor, na autoproclamada "maior democracia do mundo" (mas isso é outra discussão). Lá, depois da guerra do Iraque, as principais discussões são a autorização para abortar e o chamado "casamento gay".

Aí fiquei aqui pensando sobre a questão das escolhas. E a liberdade que temos (ou achamos que temos) para fazê-las.

No caso dos EUA, tenho um casal de amigos que vai "votar" no Bush Jr. exclusivamente porque ele é pro-life (contra o aborto), em oposição ao Kerry, que é pro-choice (a favor da escolha sobre abortar ou não).

No Rio, dizem que o projeto fluminense não é preconceituoso porque é só para aqueles que voluntariamente quiserem "se curar" -- a não ser que sejam menores de idade, porque aí é decisão dos pais. Leiam a coluna que vocês vão saber os detalhes sórdidos.

Mas divago. Vamos voltar à discussão principal. Será que realmente escolhemos o que achamos que escolhemos? Será que diversas opções que nos enchem o peito de orgulho e nos fazem sentir autônomos e únicos não são simplesmente nossa maneira de obedecer ao que nos cerca desde sempre? Será que nossa escolha de sair da casa dos pais (ou ir ficando nela), de casar, de mudar de emprego, disso e daquilo não são só vontades pré-programadas a que nos curvamos sem nem saber?

Quando estamos cercados por qualquer contexto, aquilo que o forma nos parece natural, "normal", não é mesmo? E nossas opções partem dessa base, não é assim? Então, como fica a tão-falada individualidade que tentam nos vender em propaganda de carro? Onde ficam as vontades realmente nossas (como essas que o Fabricio coloca aí embaixo)? Tenho cá minhas dúvidas se sequer existem -- ou resolvem.

Bom, esse post não pretende chegar a lugar nenhum. Mas proponho uma reflexão: Que vontades suas são realmente suas? O que você realmente quer ou, no fundo, querem que você queira? Será que esse seu celular foi desejo seu? Será que aquele consórcio vale o preço que você paga? Será que a música que você gosta, o filme que você está a fim de ver, a "mina" que você quer "pegar", têm realmente a ver com você? Melhor: será que conseguimos saber onde termina a gente/indivíduo e onde começa a gente/coletivo? Sei lá...

Ah, e antes que me acusem de ficar em cima do muro sobre os assuntos lá em cima, tenho minhas opiniões, ou pelo menos acredito que sejam minhas :-). Quanto ao homossexualismo, tenho cá comigo que o que duas ou mais pessoas fazem na cama (ou "nas quatro linhas", como diz uma amiga), desde que consensual, é uma questão delas e pronto. Pessoalmente, no entanto, o lifestyle da parcela maior -- ou mais visível, pelo menos -- da comunidade gay, que se apóia na tríade superficialidade/promiscuidade/futilidade, me incomoda um pouco. Mas não me parece que dinheiro público seja para dar conta disso. E sou, a princípio, contra o aborto, apesar de várias dúvidas.


Agora, em um ou outro caso, adapto para aqui aquela fala já rota e gasta do Voltaire: "mesmo que não concorde com uma palavra sequer do que dizeis, defenderei até a morte o vosso direito de dizê-las". Caso contrário, não teremos escolha a não ser a de permanecer escravos incontestes do senso-comum para o resto de nossas vidinhas meRdíocres!