14.9.03

Prelúdio

Eu sou mais uma daquelas criaturas que todos ignoram. Até não ignorarem mais. Sou como sua pior doença, da qual você só se lembra quando lhe faltam forças.
Nunca sou apreciada, agraciada. Ou sequer sobre mim são feitos comentários construtivos.
Alguns temem minha presença e absolutamente ninguém me olha nos olhos.

Mas não me tomem por inofensiva, fraca, frágil.
Você me olha de um patamar que não existe, esquecendo-se de que, embora eu não viva mais do que o tempo de algumas centenas de batidas do seu coração, o legado que posso deixar pode devastar sua vida.
Vou me alimentar do seu sangue, pisar sobre suas feridas e defecar em sua boca; suas fezes serão meu banquete e desse banquete nova vida, pútrida, fétida e inexorável, nascerá.

E vou tirar seu sono, fazendo você ouvir meu canto. E vou caminhar sobre seu corpo adormecido e sobre ele reinar absoluta. E antes que você possa levantar sua pesada mão eu vou estar longe, pronta para observar o caos, a chagas, a tristeza e a apatia se abaterem sobre sua desprezível vida. E sentir brilhar em meus olhos milhares de reflexos de seu corpo se contorcendo, tentando imaginar quais pecados cometeu para merecer tamanho suplício. Mas fui eu. Apenas eu, a causadora de tudo.

Do caos, eu sou a encarnação.
Do fétido, eu sou a usurpadora.
Da morte, eu sou a mensageira.
Da doença, eu sou a mãe.
Da insignificância, eu sou a filha.
E deste blog eu sou o símbolo.

Os dias estão numerados.

See Ya