14.2.07

R.I.P.

Começou como um certo desconforto, uma sensação de ser permanentemente observado. Convivi um tempo com ele, mas o incômodo cresceu. Então num belo dia o processo começou. Primeiro eliminei as fotos, depois os bilhetinhos, por fim os depoimentos. Mas eu continuava ali, visível, presente. Volta e meia eu dizia: "é hoje que eu acabo com isso tudo", mas continuava adiando. O hábito, sabe como é? Até que, simbolicamente, aproximou-se meu aniversário. Inferno astral, essas coisas. E uma tia tem a teoria de que as pessoas morrem entre um mês antes e um mês depois de seus aniversários. Achei que era uma boa hora e, finalmente, criei coragem... Cliquei em "excluir conta", e afinal consumei irrevogavelmente meu orkuticídio.

**********

Bom, historinha à parte, realmente "deu pra ti", como dizem meus amigos gaúchos. Cansei da exposição, das pressuposições, da vitrine. Uns dois anos e meio atrás, quando recebi o convite de um amigo -- ele mesmo já fora do orkut --, eu nem tinha idéia do que se tratava. Aí entrei, me familiarizei, e foi até bem divertido por um tempo. Foi legal ser reencontrado por pessoas queridas de um passado remoto e não-tão-remoto-assim, participar de ou ter comunidades divertidas, saber dos aniversários de quem eu não sabia, receber o carinho de pessoas que me honram com a presença nas minhas apresentações, ter mais uma forma de contato com amigos, e por aí vai.

Só que, com o tempo, a coisa foi tomando outra cara e ficando meio Big Brother demais (mais uma vez: o do Orwell, não o da Globo!). Não estou falando aqui dos riscos de seqüestro, roubo, violência desse naipe. (Aliás, alguém viu o filme "A Rede", com a Sandra Bullock? É meio datado -- tá, é beeem datado --, mas é curioso e toca nesse ponto. E é divertido ver o povo brigando por um disquete heheh... Divago, porém: voltemos ao assunto em pauta.) Sei que o perigo existe e inclusive vai bem além das comunidades virtuais.

Mas o meu foco é o risco da "perda de novidades", por assim dizer. A perda da privacidade. A perda da surpresa. Dos encontros e desencontros aleatórios. Para exemplificar: um cara que eu conheço conheceu uma mina no chat de um desses sites de relacionamento. Eles combinaram um encontro. Só que, antes, ele descobriu o orkut dela (que ela não havia falado, mas ele juntou informações daqui e dali) e já foi encontrá-la sabendo em que colégios ela estudou, quando terminou o colegial, que faculdade faz, que balada/praias freqüenta, de que tipo de som gosta. E já preparou toda a sedução de antemão, afinal sabia como agradar.

Pode ser que este seja o novo e natural jeito de se relacionar. Beleza, divirtam-se. Mas fica aqui o manifesto de um tiozinho por mais espontaneidade nos relacionamentos. Hoje morri no orkut -- e com isso espero ter renascido para a possibilidade de algumas descobertas...