30.8.06

O que é normal, afinal?

É normal a gente achar normal...

... que fanáticos religiosos, carentes de um sentido próprio para suas vidas, inventem uma guerra e ainda tentem qualificá-la como "justa" e "santa", com o apoio ingênuo de alguns e espúrio de tantos outros?

... que apresentadores de um programa de rádio, referindo-se a essa mesma guerra, digam que "o que vai brilhar nesta guerra, em vez da TV, rádio e jornais, é a cobertura pela Internet, em sites de notícias e blogs", como se fosse um torneio de futebol?

... que tenhamos o nível de candidatos que temos nessas eleições? Que um bando de medíocres sustentados com nossa grana trabalhe durante três dias em dois meses e todos achem que está tudo bem? Aliás, que o Paulo Maluf seja candidato a qualquer coisa?

... que milhões e milhões de pessoas gastem quase 40% do que ganham com impostos e ainda tenham que pagar escola particular, plano de saúde particular, previdência privada, segurança particular... pacificamente?

... que, depois do farol mudar para verde, tenhamos que esperar algum tempo para arrancar o carro sem bater? E que não possamos parar no amarelo, se não o carro de trás vai nos abalroar e o motorista vai nos mandar à merda (no mínimo)?

... que marmanjos de quase trinta anos, que têm profissão e trabalham, vivam às custas dos pais e não se envergonhem? E que esses pais, por culpa, frustração ou falta de coragem de terem tido a vida que queriam e sonhavam, sujeitem-se a isso?

... que no trabalho, onde antes havia dez pessoas para produzir 100%, hoje haja cinco para produzir 150%, e que o que antes levava dois dias para ser bem feito hoje tenha que levar duas horas para ser muito bem feito?

... que não haja vontade, tempo, espaço, desejo de pensar sobre o que se faz, o que se sente, o que se quer, obedecendo cegamente ao que o deus-mercado e seus representantes (marqueteiros, publicitários, "celebridades", "formadores de opinião") determinam?

... que os relacionamentos estejam cada vez mais contaminados pelo receio, pela desconfiança, pelo descompromisso e pela superficialidade que brotam do medo de se mostrar por inteiro e estar por inteiro?

... que no meio disso tudo vicejem pessoas que acham suficiente dizer e pensar: "é assim mesmo" e pautem suas vidas pelo conformismo, manutenção e valorização do (muitas vezes estúpido e estéril) status quo?

... que, apesar da explosão dos livros de auto-ajuda, e das bancas coalhadas de revistas com capas que mostram "15 dicas para...", "10 maneiras de...", "35 segredos para...", haja cada vez menos gente honestamente sentindo-se bem-sucedida e feliz?

... que quem lê, pensa, pergunta, argumenta, põe o dedo na ferida, debate, polemiza, discorda, critica, busca, aperfeiçoa -- pensa, enfim -- seja classificado como "alternativo", "poeta" [!], "rebelde", "exótico"?

É, deve ser normal. Anormal sou eu, que ainda estranho e questiono tanto e tento fazer algo para mudar um pouco. Só que tem hora que dá um cansaço, um desânimo, uma raiva, uma solidão... Pára o mundo que eu quero descer!