11.5.05

Jack Undercall

Estranho como ultimamente só tenho tido inspiração de escrever quando estou triste ou chateado com algo. E não pensem vocês que o fato de eu estar longe daqui há quase um mês e meio significa que não tenho me encontrado muito neste estado. O problema todo é que invariavelmente neste estado eu sempre me encontro totalmente sem vontade de escrever.

E de forma nenhuma isso significa sem idéias.

Isso já havia acontecido antes em minha vida. No meio da minha adolescência criei um personagem chamado Jack Undercall, ou Jackal (inglês para Chacal), como preferia ser chamado. Independente de cenário, pois eu escrevi sobre ele na América do fim do século XIX e também em histórias futurísticas de ficção científica, Jack era um cara inescrupuloso, frio, determinado e definitivamente sarcástico. E eu ficava surpreso ao perceber que somente quando estava muito puto, com muita raiva ou muito triste é que Jack se libertava das minhas entranhas cerebrais e ganhava as páginas de meus tantos cadernos de rascunho.

Jack morreu. Pelo menos naquelas páginas. Nunca mais escrevi sobre ele. Nunca mais deixei que ele matasse alguém friamente ou enganasse ou humilhasse alguém. Alguns psicólogos viriam babando pra dizer que aquilo era parte da minha personalidade se formando e que Jack era a liberação de impulsos reprimidos por sensações e sentimentos ruins. Continuem babando, eu tenho outra teoria.

Jack Undercall era, na verdade, o futuro. Ele se apresentou pra mim antes do tempo e certamente adivinhou muito do que vemos por aí. Hoje ser sarcástico é cool, é engraçado. Humor negro é quase somente o que sobrou depois que todas as piadas ficaram velhas. Talvez seja o nada sutil surrealismo que nos envolve nos dias de hoje. Talvez seja o vazio e o descaso que tomou conta da maioria dos medíocres que pisam nestas terras de ninguém. Talvez seja só a percepção confirmada de que o ser humano pode ser, e é, seu pior inimigo. Talvez eu só esteja num dia ruim e nada disso seja verdade.

Verdade ou não, acredito que Jack sabia o que estava fazendo. Ele era o inconsciente coletivo se apresentando diante dos meus olhos. Tivesse prestado mais atenção a ele, talvez hoje eu tivesse uns milhões a mais no bolso e pudesse não enxergar nada disso.

Tenho a nítida impressão de que este texto ainda não acabou. Por outro lado, tenho certeza de que minha vontade de escrevê-lo já se foi há tempos. Jack venceu. Ele sempre vence.

See Ya