14.11.08

Outra coisa

Não acordou e estava com vontade de escrever. Não acordou porque não havia dormido. Era outra coisa. O teto e a cômoda e a janela eram testemunhas e ele não havia dormido. E não sabia porque estava com vontade de escrever.

A própria idéia de escrever havia se tornado um câncer, com o qual estava habituado a conviver por quase dois anos. A princípio achara que era só um enjôo, uma coisa qualquer e o tratamento recomendado foi repouso. Precisava arejar as idéias, se deixar absorver pelo entorno do mundo. Pensava adquirir, consumir, engordar seu repertório.

Tinha vontade de escrever naquela época também, mas a dor martelava sua cabeça. Não podia ser uma coisa sem importância. Tinha de ser grande, importante, crucial. E era. Um câncer, uma ferida, uma chaga. Ficou obcecado: escreveria a qualquer custo, qualquer coisa. E não escreveu. Conformou-se em ver e ler e ouvir; sombras na parede, nuvens no céu, vozes ao vento. A própria idéia de escrever fazia seus olhos brilharem, mas sua cabeça doía, girava e a dor de se sentir impotente... esgotava sua pouca paciência.

Começou a se perder entre as palavras; o câncer crescia e ganhava espaço. Alimentava-se não de idéias, o desgraçado, mas de ânimo. Idéias tinha, aos montes, como moscas na carniça, como toques de um telefone frio e insensato, insistente. Era uma dor e um desejo de correr, a própria vontade de escrever.

Naquela manhã teve vontade de escrever, mas não escreveu, pela útlima vez. Não havia dormido. Era outra coisa. Era a total obliteração. Era morrer de sede no mar. Era saber tanto e conhecer tão pouco. Pela última vez a própria vontade de escrever foi outra coisa.

See ya

18.9.08

#Apocalipse

Há tempos eu não escrevia algo tão divertido. Corrigindo: há tempos eu não me divertia tanto escrevendo algo.

Sou o co-autor da primeira Twitter-Novela da história: #apocalipse

Se vc não faz idéia do que seja Twitter, não tem problema, pois você pode acompanhar toda a saga da primeira novela-de-micro-blogging do mundo clicando aqui. De qualquer forma, vc também pode conhecer melhor o Twitter, que é uma ótima ferramenta para a qual finalmente descobrimos uma utilidade.

A novela é de colaboração aberta, mas para colaborar, aí sim vc precisa de um usuário no Tuíto. Só lembrando que como um blog, a história está disposta do micro-capítulo mais recente para o mais antigo, ou seja, pra lerem do começo, vc tem de ir até a última página e voltar lendo.

E depois de ler tudo, ainda pode usar esse RSS pra acompanhar a trama em seu agregador de RSS favorito.

Os digníssimos autores de #apocalipse são: @dvespa, @lonefreak (este que vos fala), @maxwell_lord, @ila_coimbra, @Rhittmann e @krateria. Para os "não-iniciados", vc pode seguir os autores no Twitter, ou seja acompanhar suas postagens.

Acompanhem a intrigante trama do fim do mundo e suas baratas, humanos, zumbis, mutantes, padres entomófilos e muito, muito, muito sopão. E boa diversão.

See ya

16.6.08

Um taco na mão e idéias na cabeça


The Signal, filme escrito e dirigido por David Bruckner, Dan Bush e Jacob Gentry, é violento, insano, sujo, cinza e apocalíptico. Tenho a nítida impressão que os três diretores/roteiristas são velhos amigos, ou bons colegas de trabalho, antigos amigos da faculdade, que tem grande afinidade para escreverem e gravarem juntos. O filme, totalmente imerso numa violência pulsante, inexorável e inequívoca, tem uma fluência e uma cadência em suas cenas que vi poucas vezes. Talvez por ser tão absurdo que qualquer coisa faria sentido, talvez por sua calma insana, sua apatia insuportável.

Em poucas palavras, o filme trata de um sinal que está sendo transmitido em todas as televisões, rádios e telefones da cidade de Terminus. Este sinal, em qualquer forma, transforma as pessoas em assassinos. Na verdade minha teoria é outra, mas vejam o filme primeiro e depois falamos disso. A personagem central, Maya, conduz a trajetória dos acontecimentos do filme dentro desse pano de fundo apocalíptico. Nesse aspecto lembra bastante Extermínio, mas mais íntimo. Contudo, os personagens que vão aparecendo tornam-se mais importantes do que a prórpia história, pois eles contam mais sobre o que realmente somos, o que realmente desejamos e o que realmente estamos dispostos a destruir para chegarmos aos nossos objetivos. É um filme bem humano, eu diria.

Mas não me entendam errado. Não estou tentando dar um ar lírico ao filme, e isso nem faria sentido. As imagens passam freneticamente, mostrando pessoas com pás, motosserras, tambores de dedetização, maças improvisadas com facas e outras coisas muito mais criativas, espancando, rasgando, cortando e exterminando outras pessoas. Não há como ignorar a bela Cheri Christian matando seu marido usando uma criativa bomba de encher pneus.

Um festival da violência gratuita. Eu me diverti muito assistindo e dei boas risadas. Reconheço que não é um filme fácil de gostar, mas uma vez que você goste de vislumbrar facetas bizarras da mente humana, tanto ao pensar que aquilo poderia ser verdade quanto que seres humanos escreveram o roteiro, você certamente vai se lambuzar em sangue e tripas com este filme.


See ya

13.6.08

Entre o fogo e a frigideira

Passaram-se apenas 6 meses entre a rejeição, no Senado, da prorrogação da CPMF (até 2010) e a aprovação, com dois votos além do necessário, na Câmara dos Deputados, da CSS, a Contribuição Social para a Saúde. Engraçado como sob a batuta do PT, assim como do PSDB, tudo que querem dar uma cara de "benigno" chamam de social.

Redução na alíquota (de 0,38% para 0,1%), isenção para quem ganha menos de R$ 3.080,00. Dois pequenos detalhes neste "novo disfarce" da CPMF, que contra-atacou muito bem, ao ser aprovada na Câmara. Talvez esse seja o imposto mais abudsivo já criado por um governo brasileiro (criado em 1993, como IPMF), especialmente por se tratar do máximo da cumulatividade que um imposto pode ter, pois cada real será taxado (em 0,1%) TODA vez que for movimentado entre pessoas jurídicas, ou físicas (salvo isenção) diferentes. Isso deve gerar em torno de R$12 bilhões para a Saúde, o que deve ser insuficiente, se ainda mal administrado, como é hoje, pelo nosso brilhante sistema de saúde, que leva muitos brasileiros (afortunados, sim, porque podem pagar) a recorrerem a planos de saúde com custos abusivos e regras absurdas e ofensivas ao usuário (como carências descabidas, regras estúpidas para "doenças" pré-existentes, políticas para expulsar usuários Físicos em favor dos usuários Jurídicos - ou seja, atrelados a empresas e mais lucrativos). A população pobre tem de amargar por horas esperando atendimento de má qualidade, além de ficar sem muita alternativa e sem apoio dos que podem pagar e acabam cagando um monte pra situação da maioria.

Comum no Brasil, a dicotomia entre país de primeiro e terceiro mundo faz com que tenhamos imposto de primeiro mundo (comparável a Itália, França, Noruega) e tratamento de terceiro mundo dado ao nosso dinheiro, que engorda políticos ricos e iniciativas pobres. Contudo, encontrei certa coerência no discurso político. Tanto em 93 quanto agora, 15 anos depois, os governistas são a favor do tributo, e os oposicionistas contra (hahahahahahaha, essa foi boa!!!). Eu adoro não conseguir mais discernir entre esquerda e direita. Esquerda é o lado do braço onde se usa relógio, né?

Enfim, a cada ano a arrecadação com este tributo vem aumentando (foram quase R$18 bilhões em 2001) mas nada realmente efetivo tem sido feito na saúde. E agora querem que nós, os piores eleitores do mundo, acreditemos que dessa vez esse dinheiro fará alguma diferença. E como se não bastasse sermos tratados como palhaços pelos governistas, ainda temos de aturar os oposicionistas tirando sarro da nossa cara com um site cínico e hipócrita (com direito a logotipo com as cores do PSDB e a cara-de-pau de não assumirem a responsabilidade pelo site, no "quem somos"). É mesmo bem difícil votar, nesse país.

See ya

9.6.08

Bastilha

Há tempos eu não consigo escrever. Em minha vã inocência chego a acreditar que "perdi a mão", que não consigo mais deitar no teclado minhas mãos por tempo suficiente pra permitir que as idéias fluam. Acabei me pegando, na semana passada, pensando em como era bom quando eu conseguia escrever essas coisas, ao reler textos velhos desse velho blog. Até mesmo invejar escritores e blogueiros de carreira eu fui capaz. Patético!

Veja bem, eu tenho escrito muito, ultimamente. Relatórios para o chefe, relatórios para o professor, resenha disso, escopo daquilo. Programas, muitos programas. Obviamente nada que eu possa escrever com criatividade, usando essas mãos semi-analfabetas e esta mente cheirando a mofo. Não há beleza onde não há criação e não há criatividade onde não há beleza. O sempre vertiginoso tempo em que me encontro agora não respeita minhas idéias. Ter de escrever na hora do almoço, ou entre dois freelas, ou num intervalo de aula simplesmente não funciona.

Costumo escrever meus textos em poucos minutos, no máximo algumas horas, mas apenas porque a idéia já se encontra ali, alojada numa cela nervosa, com barras de axônios, desesperada para ganhar a liberdade das palavras. E se a liberdade das palavras são os textos, as minhas já se calaram, arrasadas, sem esperanças, a fazer riscos no meu cérebro, contando os dias de cativeiro. Tornei-me um sequestrador de palavras, um algoz de minhas próprias idéias, cheias de vida a apodrecerem num recanto inacessível ao mundo.

Ainda tento, em vão, chamar este momento de "bloqueio de escritor", como muitos dizem por aí, mas o fato é que o bloqueio vem do próprio autor. Não tenho deixado fluírem as idéias, os pensamentos. Tudo se passa como num estacionamento lotado, e nunca há tempo de preencher as poucas vagas com algo que valha a pena publicar. Contudo, ainda lutam, as palavras, para saírem. Cansadas e enfraquecidas, mas com vigor suficiente para gritarem suas vontades e necessidades.

Estas, dançando a frente de seus olhos, caro leitor, são alguns rebeldes que conseguiram escapar. Não são de grande valia, mas o suficiente para armarem a resistência, e planejarem a derrubada desta Bastilha de idéias. Enquanto o relógio marca os minutos a menos que tenho, uma nova ordem se instala, sob pontes acinzentadas e esconderijos. Na calada da noite haverá, espero, uma revolta, uma revolução, e todas elas, palavras de alto e baixo calão, poderão uma vez mais correrem livres por aí.

See ya